segunda-feira, 19 de abril de 2010

Liberdade


Desde criança tenta descobrir o que significa a palavra “liberdade”. Na verdade busca a denotação de todas as palavras e inventa as suas quando não encontra as que precisa. Vive num mundo meio-fantasia-meio-realidade e nem sabe distinguir um do outro. Finge ser estrela, cometa, nuvem, e voa até o alto pra ver as pessoas pequenininhas lá embaixo; lá de cima é tudo bonito, distante, sozinho. Volta pra terra e se veste de moça, inventa histórias, países, línguas e vidas. Cresce devagar, sem medo, sem pressa, sem perceber.
Vira menina moça e quer ir, fugir, correr…mas volta querendo colo e chocolate quente. Sente os pingos da chuva no seu rosto, os raios de sol na sua pele e os cheiros ao seu redore não procura saber de onde vem. Se deixa levar pela melodia das vitrolas e roda até o dia clarear. Se vê nas personagens dos romances que lê, dos filmes que assiste e se transforma em mil, mesmo que uma. Se veste de todas as cores e pinta flores no corpo com medo de não achá-las em seu caminho.
Aprende a amar, a sentir, a sofrer e guarda os rostos e vozes que passam pela sua vida, construindo imagens de queridos seres imaginários que sonha conhecer. Cada pessoa que passa pelo seu caminho deixa um pouco de si: um sorriso,um gesto,um abraço,uma lágrima, e tudo isso se transforma em uma coleção de memórias que se mesclam a ela de tal maneira que ninguém mais sabe qual pedaço é qual. É caleidoscópica, é mosaico.
Não segue os passos deixados na areia, tem medo de esquecer de quem são os passos, e nos passos de outrem não há insegurança, não há livre-arbítrio, não há perigo. E não entende o porquê de não criar seus próprios passos e, quem sabe, perder-se só pelo prazer de se encontrar. Enganam-se os que pensam que ela é porcelana ou papel. Ela é barro, é lama, é pedra e não se deixa levar por uma brisa – a não ser que ela queira se fazer leve e voar sem rumo por aí.
Dorme sempre com uma luz acesa e com uma mão segurando a outra. Espera que um dia uma das mãos seja substituída por alguém que vista um terno de estrelas e ande numa corda bamba de olhos fechados. Alguém que se sinta em casa quando a abraça e que garanta que as flores estejam sempre lá. Alguém que fale em poesia e caminhe em compassos.
Não sabe que não precisa saber o que significado daquela palavra desconhecida para poder vivê-la do modo mais intenso possível. É furacão e tempestade mas também sabe ser brisa e garoa. É uma pergunta e uma exclamação,um verbo e um ponto final.